quinta-feira, novembro 29, 2007

De terra e de mar

Num arrebatamento de irreverência mais do que de cansaço cravou a enxada na terra seca e caiu de joelhos. Gotas de suor partiam desencontradas da fronte para se unirem silenciosas no maciço pescoço enrugado.
Com as mãos sujas, mãos de terra e de sol, cobriu os dois olhos de trevas. E nas trevas um barco pequeno e um mar revolto e uma luta justa com um magnânimo peixe e o encontro com as sereias e as solitárias conversas com o deus dos mares e a frescura de uma felicidade de sonho. Lá longe, no grande azul, o Sol já se punha.
A inoportuna consciência do trabalho por fazer acordou-o.
Mãos de terra e de sol no cabo nodoso da arrogante enxada. Um puxão. E nada. Outro. E a inércia. De costas vergadas pelo esforço, de olhos arregalados pela força, tombou. O torpor da enxada diluía-se nele. Deitado, fechou as pálpebras morenas e chorou. Vertia na terra o mar que sempre trouxe dentro de si.

5 comentários:

cr0ft disse...

:D yeah

Sarushka disse...

"...uma amizade que a escrita conhece tao bem"

:) *

Unknown disse...

quando fazes estes posts especialmente bonitos...eu gosto de deixar os meus comentarios especialmente estupidos..

pois bem, hj nao me sinto suficientemente estupida!!

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ANNUNCIATA disse...

Também eu às vezes me sinto esse velho de exada na mão, com alma de mar e de pescador.
Mas só as vezes...a terra seca também me espera, como que a avisar que o mar distante nada mais tem a dar que não seja o doce movimento das ondas e o cheiro a maresia...



Beijinho *

Anónimo disse...

Lindo sarinha... mesmo :)

(é... não costumo aparecer aqui, mas acho que o vou começar a fazer mais assiduamente... :p)