quarta-feira, fevereiro 23, 2011

Empatia

Se à antipatia fosse dada a escolha da sua aparência, seriam aqueles os olhos, o cabelo, a expressão que escolheria. A impressão que ficava a quem a conhecia, não era a de que ela era antipática mas a de que era a própria antipatia.

Perante gracejos e afeições, a postura da criatura elevava uma massiva superfície anti-aderente, repulsiva. E esse incómodo atributo destacava-se ainda mais naquela família, dada a partilhas, a abraços e gargalhadas. Foi à festa menos por vontade de participar das comemorações do que para evitar que o namorado fosse sem ela. Não entendia que ele pertencesse àquele clã que agora via, onde a existência se desenrolava, intrometida, num enorme espaço público onde a privacidade não cabia.

À vulgaridade das questões que lhe dirigiram respondeu com um silêncio nauseado, desencorajador. No entanto, em vez de dissuadir as atenções, limitou-se a afastá-las. Num pequeno círculo, perto de si, comentava-se com amargura e um certo tom de indignação a escolha (pouco) amorosa do benjamim. Como num concílio tácito, decidiram votá-la à transparência.

O vaticínio teria sido outro se soubessem dos dois primeiros anos de existência incómoda para quem não a desejou e dos dez anos, casas, pais que lhes sucederam ou dos últimos quatro passados numa instituição onde nada nem ninguém era seu.

Ele era seu. Ele era a sua empatia.

1 comentário:

Mónica disse...

Perdona por no leerlo antes , pero como últimamente tardabas tanto en escribir , lo miré hoy por casualidad y me sorprendiste .Como siempre impecable .Muchos besos .