Deitada na cama, empurrou o cobertor e deixou a descoberto o corpo vazio. Olhou, demoradamente e sem pena, mãos, pés, pernas, mamas, braços descarnados que não eram seus. Abandonada a guerra que travava há dois, dez, cem anos, era só paz o que vestia.
Ligou à amiga de sempre. Sempre suave, sempre quente, despediu-se com um até sempre, Aurora.
Ligou aos filhos. Chamou-os. Riu com as suas lágrimas e pediu, menos por vaidade do que por piedade da dor deles, que a fizessem bonita. Sorriu sempre, com o sol que trazia no peito. Quis beijos de boa noite. E a noite chegou.
Deitada no longo carro negro, partiu para a terra onde começou. Ia a meio o caminho quando a viatura falhou. Negro o carro, negro o fumo, negro o espírito dos que o seguiam. O filho, entendido nas artes da mecânica como nas artes do amor, quis conduzi-lo apesar da relutância do negro condutor. Sem mais quebras, a máquina deslizou até ao destino.
Foi muito sussurrada a engenhosa habilidade do rapaz mas, adormecida, ela sabia que, de estranheza, o episódio teve só o que de estranho tem o amor.
3 comentários:
Gracias por tus palabras para ella. Te quiero .
Ya sabes que eres mi sobrina favorita ,pero tus palabras me hacen quererte más .Tu tía que te adora .
;)
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